segunda-feira, 20 de setembro de 2010

A Essência e o Ego: ou a Chapeuzinho Vermelho e o Lobo Mau dentro de nós




 
 
Alegorias, parábolas, histórias cheias de simbolismos guardam o ensinamento da Escola de Mistérios Maiores, a Escola Cósmica, a única que entrega todas as verdades e todas as respostas de todos os tempos e de todos os mundos. Visíveis ou invisíveis.
 
Quando se perde o fio da meada da origem dessas alegorias, como no caso dos contos de fadas, já podemos suspeitar que além da autoria, o que se perdeu no tempo, no boca à boca das gerações, foi também o seu autêntico significado. Especialmente o que isso tem de prático na nossa vida.
 
Porém, se abrirmos as percepções para buscarmos esse significado autêntico, resgatá-lo em sua profundidade com a consciência, encontraremos a Lei das Analogias em todas, todas essas histórias, que não são apenas contos de fadas... Elas tem realidade causal e são ensinamentos vivos! Pegam fogo! Até mesmo os antigos gregos contavam para suas crianças a história da Chapeuzinho Vermelho! Vejam só...
 
Mas, e nós? Quantas vezes NÓS ouvimos essa história quando criança, querendo saber a verdade contida numa história como essa? Onde vivia essa tal Chapeuzinho? Por que o Lobo Mau queria “comê-la”? Lobos não comem gente! Por que comeriam uma menina? E por que a mamãe mandou a garota sozinha, numa floresta tão perigosa, levar comida para a vovó que estava doente?!
 
Questionamentos infantis?
 
Depois de adultos, quantas vezes reproduzimos esta “historinha” de forma mecânica, sem inquietude alguma... Seria essa apenas mais uma historinha para “criança dormir”, um conto sem sentido real? Seria esse um conto de “ninar” ou uma história para “acordar”?
 
A Chapeuzinho Vermelho é a clara representação da Essência, que por ora dorme e está vulnerável à má ação do Ego dentro de nós. A essência é o ouro para o ego, o bandido interno. É o mel do urso invasor. É o alimento vivo e fresco para o lobo mau comedor de criancinhas, que faz da nossa psicologia sua floresta, sua morada. E o Lobo Mau é nada menos do que a representação clássica da astúcia do ego em nossa própria psicologia!
 
As essências, as criancinhas, as pequeninas partículas do Real Ser são e sempre serão o alvo do ego. Elas são os detalhes pequeníssimos que precisamos nos ater a cada instante do dia na auto-observação. O ego quer esses detalhes, deseja, cobiça, engana, precisa se alimentar dos detalhes que vêm da essência para continuar sobrevivendo. Para alcançar esse objetivo subjetivamente nefasto, o ego em nós encontra as mais variadas formas de ludibriar a nós mesmos para que entreguemos aquilo que o faz continuar vivo, sagaz e dominante.  Sempre se disfarça de inteligência, de falso conhecimento acumulado, de teorias inúteis e mortas e de milhões de falácias e falatórios para convencer-nos de que aquele pensamento, aquele sentimento, aquela atitude é boa, é real, é necessária, é justificável, ou que necessitamos da mente, do intelecto subjetivo, da nossa moral equivocada para viver.
 
O lobo dentro de nós está sempre à espreita. Conhece muito bem a floresta, o seu território, a mente e seus floreios, onde “o lobo mau sempre passeia por perto”.
 
Little Red Riding Hood, de Gustave Dore (d. 1883)


 
 
Se não buscamos aprender a suplicar ao Divino para acordar a essência, para deixá-la pulsante e vigilante, para despertá-la aqui e agora e o tempo inteiro, certamente vamos cair no velho conto de mostrar o caminho ao inimigo.
 
“Onde você vai?”, pergunta curioso o Lobo Mau.
“Vou à casa da minha vó, levar um presente. Ela está muito doente.”
“Onde mora a sua vó?”
 
“Onde mora a sua vó???” Por que a mente quer sempre saber do caminho de autodescoberta, das profundidades, das nossas buscas, dos nossos instantes preciosos? Por que ela quer saber para onde vamos ou o que vamos fazer? Por que a mente sempre se antecipa e quer saber de antemão sobre a “morada da SABEDORIA, da avó, da ancentral”, que também por ora está moribunda em nós, precisando de alimento, de átomos crísticos?
 
Merece alguma resposta o Lobo Mau? Qual seria a resposta nesse exato instante?
 
Uma súplica? “Pai, protege-me, Mãe, desintegra esse defeito, tira-o do Teu caminho!”
É urgente compreender, e mais do que tudo praticar para poder então compreender, as práticas Revolucionárias e Místicas que a Gnose entrega. Assim conseguiremos ter claro o que significa a morte psicológica, o que é a busca pelo despertar, o que temos que fazer no exato instante em que vemos os defeitos psicológicos se precipitando.
 
Sim, não há dúvidas, o Lobo sempre se precipita. Mas antes de tudo, precisamos primeiro conhecer a Chapeuzinho e também o Lobo. Além de tudo, diferenciar que é a Vovozinha (a autêntica sabedoria) e o que é a falácia do Lobo disfarçado de vovozinha! (a falsa erudição).
 
A súplica decidida e secreta à Divindade, dentro de nós, tira do “vaso raso” da mente o controle sobre nossos pensamentos, tira-nos da freqüência baixa dos sentimentos e das emoções inferiores, livra-nos das ilusórias sensações e devolve o comando devidamente à Consciência. A petição à Mãe Divina tira o controle do ego sobre nossas ações internas e externas e coloca-nos na direção do Vazio Criador. Deste Vazio o ego não entende, absolutamente.
 
Se houver continuidade nessa prática de despertar a essência, se nos esforçarmos para compreender as simbologias dos sonhos, se transformarmos as impressões que nos chegam a todo instante, qualquer perigo à espreita dentro de nós será mostrado e então estaremos atentos para suplicar, ao invés de dar o “ouro ao bandido”. Mas se estamos dormindo, se não buscamos a reflexão objetiva para encontrar a verdade no exato instante em que na auto-observação percebemos o eu salteador, ele nos “compra”, nos “convence” ou nos “rouba”, se antecipa e, literalmente, nos engole. Então, convencidos, satisfeitos ou não, porém mais dormentes, damos de bandeja o alimento essencial ao elemento inumano dentro de nós. Entregamos o ouro ao tolo. Mas quem é o tolo, então?
 
Sabotamos o Caminho.
 
“Pela estrada afora eu vou bem sozinha... levar esses doces para a vovozinha, ela mora longe, o caminho é deserto, e o lobo mau passeia aqui por perto”.
 
Os doces aqui não são amarguras, como podem significar muitas vezes no mundo dos sonhos.
Os doces são a representação da nossa compreensão criadora. São os detalhes, o resultado do hiper-esforço por fazer consciência, o alimento que a Mãe Divina reune com as súplicas durante o trabalho de morte psicológica. Os átomos crísticos, os pingos que foram libertados no trabalho de revolução e que precisam ser levados de volta à Divindade para religar-nos à Sabedoria que em nós está desconectada, doente.
 
Os doces são o resultado que precisamos levar para a “vovozinha”, para que ela, a Sabedoria Cósmica, guarde-os. Não devemos jamais guardá-los conosco, pois a compreensão é sutil, tênue e vulnerável, precisa ser vivida e experimentada, e a tarefa de fazer dela uma ciência é muito mais árdua. Por isso, além de fazer os “doces”, precisamos entregá-los à Sabedoria Superior. Não devemos comer dos “frutos”, já que essa seria a própria amargura. Os doces não são nossos, não são para nós, nada nos pertence.
 
Nada que leva ao caminho deserto da busca pela consciência nos pertence. Não são propriedade.
 
Le petit chaperon rouge & le loup, de Gustave Doré
 
 
Durante todo o caminho, os agregados psíquicos se disfarçam de sabedoria e o disfarce faz parte da astúcia do ego. É nesse momento em que os Mestres alertam sobre o grande risco de trilhar a senda da Busca Interior, pois quanto mais se sobe, mais perigosa vai ficando a nossa busca.
 
Além do perigo de renascer sem Morrer de fato.  Nada mais terrível do que o ego (lobo mau) querer interromper o caminho e dar um fim à Chapeuzinho Vermelho (o Fogo, o Mercúrio Vermelho) para evitar que o objetivo do caminho deserto, estreito e longo, seja desperdiçado e a tarefa não seja completada.
 
Como na história da Chapeuzinho Vermelho, não vemos a Mãe atuando nesta dimensão, mas é Ela quem nos envia à Sabedoria! É Ela quem cuida das essências. É ela quem prepara o alimento, é a partir Dela que vamos chegar à Mãe da Mãe, ou à Ela mesma, que o Lobo Mau acabou por engolir: o Fogo do Fogo que está encerrado nos defeitos psicológicos.
 
Eles, os defeitos psicológicos, sempre se alimentam das impressões nos 5 sentidos do corpo humano.
 
“- Como você tem os braços grandes, vovozinha!”
- É prá te abraçar melhor!
- E esses olhos tão grandes?
- É para te enxergar melhor, minha netinha!
- Nossa, como você tem orelhas grandes, vovozinha!
- É para te escutar melhor!
-E prá quê essa boca tão grande!?...”
 
Compreender e viver todas essas coisas é de fato algo individual e absolutamente solitário. Nem falando sobre todas essas coisas vamos chegar a compreender o que é essência, quem é o ego e por onde ele se alimenta, onde se encontra o Vazio, quem é a Mãe Divina. É preciso de fatos vividos e vívidos! Já que a teoria é uma seta e indica o Caminho, mas o Caminho não é uma teoria, estudemos a seta e trilhemos o Caminho. Fugir do caminho, do Lobo Mau, da floresta, da Mãe ou da Vovozinha não nos fará conhecedores de nós mesmos. Não será o Caminho.
 
Enfrentando-nos, nenhuma história estará separada da história da nossa própria vida. Um história feita nos detalhes, dia após dia, após dia, e após dia, e após dia...
Suraag


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